domingo, 10 de junho de 2012

QUE UM DIA,ENFIM,DESCOLORIRÁ...




A tarde era clara, tinha um conjunto de canetas coloridas, que são a possibilidade de riscar um arco-íris, produtoras da mágica de cor na vida.Pobre lápis cinza,simples,que só produz um tom – queria todas as matizes, colorir. E começou pelas pétalas da flor de lis que imitava das meninas da escola.Uma pétala subia embicando, e duas pétalas menores desciam laterais, e do meio destas um fino caule e uma folha verde.

As pétalas podiam ser de qualquer cor,tantas possibilidades.

Não sei até onde foi, não sei até onde desenhou flores salpicadas nas laterais para enfeitar o conteúdo da matéria que depois colocaria no meio,nas linhas.

Foi quando seu rosto esmigalhou contra a folha do papel, alguém havia agarrado com força seus cabelos da nuca e estava esfregando seu nariz,seus olhos,contra a folha branca,agora manchada de tanta cor e ódio.

O papel dobrando em rugas, as mãos e braços tentando empurrar a face amassada para cima e a voz, inquisidora:quem te ensina a fazer estas mariquinhagens’?Porque você não é igual aos outros meninos?Porque tudo para você tem que ser enfeitado?

O‘x’ da questão: a necessidade do enfeite.Que tipo de humanos são os,afrescalhados, que precisam da cor e da vida decorada? Não basta o risco do grafite, precisam das canetinhas para colorir. Um mundo em giz de cera, aquarela, guache.

As gotinhas de sangue de seu nariz traumatizado deixaram tom de vermelho-sangue sobre a destruída página da sua obra de arte.

De um lado, o real que deveria trilhar para ser aceito. De outro, o sonho, a realidade tão dura e, muitas vezes, cruel. Ele não via o mundo como um jardim sem flores coloridas e não queria pertencer ao mundo em preto e branco.



Entre as nuvens/Vem surgindo um lindo/Avião rosa e grená/Tudo em volta colorindo/Basta imaginar e ele está/Partindo, sereno e lindo/O fim dela ninguém sabe/

Bem ao certo onde vai dar/Vamos todos/Numa linda passarela/ De uma aquarela/Que um dia enfim/Descolorirá...