domingo, 27 de maio de 2018

(Revisitando Carlos Drummond - E agora, José?)



E agora, mané?
A gasolina acabou,
a pobreza aumentou,
o gás subiu,
o patrão se irritou,
e agora, mané?
e agora, você?
você que não passou fome
que zombou dos pobres,
você que é perverso
que trama, “protesta”
e agora, mané?

Não respeita mulher,
Não respeita o discurso,
Não respeita carinho,
já não pode receber,
já não pode gastar,
divertir já não pode,
a noite esfriou,
o uber não veio,
o táxi não veio,
o motorista não veio
não veio a empatia
A democracia acabou
A democracia sumiu 
A democracia mofou,
e agora, mané?

E agora, mané?
Sua estúpida palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
seu raciocínio furreca,
sua palavra de agouro,
seu neurônio de vidro,
sua incoerência,
seu ódio - e agora?

Com o celular na mão
se faz de morta,
não há quem lhe suporta;
quer correr para conversar,
mas a paciência acabou;
quer ir para Miami,
Vôos não há mais!
Mané, e agora?

Se você pensasse,
se você algo lesse,
se você lembrasse
das aulas pertinentes,
se você ouvisse,
se você raciocinasse,
se você estudasse...
Mas você não acorda,
você é burro, mané!

Com o exército na rua
qual capitão do mato,
sem democracia,
sem algo que usufrua
para ostentar,
sem cavalo preto
Para fugir a galope,
você pasta, mané!
Mané, até quando?


terça-feira, 15 de maio de 2018

Padres e Pastores

Quando um sacerdote se torna excessivamente midiático, como ocorre com os padres cantores ou pastores,sua espontaneidade fica ameaçada.  Torna-se um personagem de si mesmo. A fama o sufoca.   Começa a se enxergar no espelho a sua imagem contida nos olhos de seus fãs.
   
Fábio de Melo  e outros, que cometem  intolerância religiosa ao ridicularizar a macumba.  De fato, eles expressam a visão preconceituosa da maioria dos católicos e evangélicos frente às tradições religiosas de matriz africana, consideradas por eles meras superstições.

A macumba promove oferendas de alimentos e bebidas, conhecidas como despachos, aos espíritos ou entidades. A pergunta que cabe fazer a nós, católicos e outros, é qual a diferença dos despachos de macumba com as salas de ex-votos nas igrejas? Não seria também mera superstição ofertar a Nossa Senhora ou ao santo protetor réplicas em cera de órgãos e membros cujas curas são atribuídas a milagres ou intervenção divina?

Lembro que  quando eu era criança, havia cofres para recolher ofertas em dinheiro. Um deles continha a placa “Para as almas”. Ainda hoje me pergunto como as almas embolsavam as ofertas...

Deus não tem religião. Tanto a galinha da macumba quanto o pão da eucaristia são objetos de fé de quem acredita no caráter sagrado da oferenda. O vinho da missa ou culto, e a cachaça do despacho, dependem da crença dos fiéis.

Não é fácil ser tolerante quando se está convencido de que sua religião é a única admitida por Deus. Ora, a árvore se conhece por seus frutos, disse Jesus. A boa religião é aquela que prega tolerância, compaixão, partilha, respeito  e serviços aos necessitados 

sexta-feira, 11 de maio de 2018

silêncio no tribunal






Pouco antes de entrarem em cena, se dirigem, um a um, à sala de maquiagem. Reforçam a tinta capilar, remodelam a sobrancelha,
aparam pentelhinhos do nariz.
Todos pedem à moça que capriche na base e nos cremes.
Toca a campainha, eles ocupam seus lugares, o diretor grita "Ação" e seja o que
Deus quiser.
"Eu peço a palavra a Vossa Excelência para proclamar, com a vênia e a compreensão dos demais membros dessa Corte, que o progenitor de Vossa Excelência era um renomado ladravaz do alheio. Enquanto a cônjuge do mesmo, por equivalência legal, equiparação moral e justo paradigma progenitora de Vossa Excelência, faz jus, no amparo da lei, ao epíteto de mulher de vida desregrada."
"Por que Vossa Excelência não proclama, com todas as devidas palavras do embargo, o que está a blasfemar com as pouquíssimas que conhece? Que o meu pai era ladrão e que minha mãe era rameira e que, por conseguinte constitucional, eu sou um filho da puta?"
"Seria de bom tom que Vossa Excelência moderasse o vocabulário, pois não temos que ouvir aqui suas blasfêmias, vilanias, vilipêndios contumazes. Ate quando vamos ter que aturar sua presença nefasta e o seu linguajar de prostíbulo? É um desprazer cotidiano e contumaz sermos obrigados a conviver, nesse plenário, com a presença amarga de Vossa Excelência. Outrossim..."
"Outrossim, como diria Graciliano Ramos, é a puta que o pariu!"
"Data vênia, ainda não lhe concedi a palavra!"
"Então, peça vista e arquive a palavra no escaninho dos anais..."
Câmaras se deslocam para alguém, de voz suave e delicada, até então em silêncio:
"Senhores, eu peço que mantenham o nível!"
"Perdão, presidenta... Outrossim, como diria antes de ser interrompido, a presença infame e infamante de Vossa Excelência, que tanto deprecia e macula o ar desse ambiente..."
"O que macula o ar desse ambiente são os gases e o hálito de Vossa Excelência!"
Câmaras se deslocam novamente. A voz  da Presidenta, antes delicada, agora um pouco mais grave:
"Puta que o pariu, senhores! Podem manter o nível???"
Depois de servir água e café para todos, o copeiro levanta a mão e fala alto:
"Um momento da atenção de vocês, por favor!"
Param todos, espantados com a ousadia do rapaz. Os câmeras gelam. O diretor não sabe o que fazer. Antes do esperado grito de "Corta", o copeiro prossegue, dono da cena:
"Vocês acham que é para isso que eu pego dois ônibus e um trem todas as manhãs?! Para chegar aqui e ficar ouvindo esse bate-boca desagradável?!"
Deixa a bandeja de água e café, juntamente com a toalhinha branca, bem diante do laptop da presidenta. E dá as costas, resmungando:
"Ora, vão procurar um tanque de roupas! Uma lâmpada para trocar!! Uma Constituição para ler!!!"
Silêncio no tribunal.