quarta-feira, 6 de março de 2019

O SAMBA TEM DESSAS COISAS.

A Mangueira  "no som do seu tamborim e no rufar do seu tambor" ensina que  a história do negro tem que ser contada pelos negros, a história dos indígenas pelos indígenas, das mulheres pelas mulheres etc. Contar a própria história é um ato político.
É impossível falar de  história sem falar sobre poder. Não permitir que o outro conte sua própria história é destruir o outro.  Quando nós rejeitamos uma única história, quando percebemos que nunca há apenas uma história sobre nenhum lugar, nós reconquistamos nosso espaço.
Acredito que  o samba da Mangueira propõe exatamente isto: reconquistar um espaço,e esse espaco passa pela memória feita pelos seus protagonistas. E não há história neutra.

Marielle, por exemplo,  por parte do poder é considerada defensora de bandidos, mas por outra parte é considerada defensora dos direitos humanos; Lula da mesma forma tanto pode ser visto como bandido ou como preso político. A libertação da escravatura, na mesma perspetiva,  pode ser vista como fruto da bondade da princesa branca ou como processo de luta da população negra.
A Mangueira, então, faz perguntas seríssimas: De que parte do poder você vê  a história? A história que você ouve e conta é a versão do caçador ou a versão da caça ?
Parabéns e obrigado, Estação Primeira de Mangueira. Só o Samba poderia com afroternura chamar um Brasil tão regredido em suas potencialidades civilizatórias de "meu nego" e " meu dengo".
E, desse jeito carinhoso e familiar, o samba o chama a rever sua história a partir dos que o sistema de poder querem ocultar e silenciar.
A mangueira insiste: "Brasil, chegou a vez de ouvir as Marias, Mahis, Marielles, Malês". E isso é revolucionário...
O SAMBA tem  dessas coisas... O SAMBA tem muito a ensinar.
O SAMBA tem uma  afropotência extraordinária de, muitas vezes, falar de revolução sem falar de revolução!!!
Contemos, pois, nossas histórias; resgatemos nossos heróis e heroínas,  reconquistemos nossos espaços, assumamos de fato, coletivamente, o nosso  Brasil com nome de Dandara e rosto de Cariri.
E que  possamos,  assumindo nossos compromissos históricos, com alegria democrática de um carnaval sem fim, poder  chamar todos os dias  esse Brasil pluriversal de "meu nego" e "meu dengo".
O Brasil, como disse Caetano Veloso na época do assassinato de Moa do Katendê,  "não pode ser reduzido a essa coisa bárbara".
Não se faz política ou revolução sem cafuné,  sem dengo e sem chamego. E o Brasil carece de cheiro no cangote!
Como uma Preta-Velha, a Estação Primeira de Mangueira bota o Brasil no colo,  o chama de "dengo" e o ajuda a   ouvir "histórias que os livros não contam".

Rudah, como a Doidamares viu Jesus na goiabeira, eu o vi desfilando sorridente na MANGUEIRA!

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