quinta-feira, 10 de novembro de 2022

Dia estranho, o de ontem

 

O presidente eleito Lula foi a Brasília e ocupou todos os espaços políticos. Falou de volta à normalidade e em diálogo com as instituições. Depois de quatro anos de conflitos, a palavra “normalidade” soou muito bem.  Tudo conforme o esperado de um presidente eleito, mas parecia novidade. Foi dia de brilho na política, de dor, na cultura, de vergonha dos generais.


🎼Tente esquecer em que ano estamos🎼.

É 2022 quase no fim, mas por um momento parecia meio século atrás. Ainda há rumores nos quartéis como se fosse admissível que tenhamos que passar por isso a essa altura. Com a morte da Gal, a imensidão da perda, a voz cristalina, perfeita, pareceu ainda mais inaceitável o ponto desafinado do dia: a espera do relatório da Defesa sobre as urnas. Gal, no tempo em que os militares nos impunham o terror, era luz e encantamento, era conforto e desforra.


“🎼Com minhas calças vermelhas, meu casaco de general, cheio de anéis, eu vou descendo por todas as ruas, até tomar aquele velho navio”🎼.

Gal era atrevimento na atitude e na voz que derrotava a guitarra. Isso era muito, era o que precisávamos.

Os milicos, em seu relatório disse que não investigou crime eleitoral. Como se tivesse essa atribuição. Mas insinuou, deixou no ar, exatamente como foi determinado pelo futuro ex presidente Bolsonaro que fizesse. Falou em um “relevante risco à segurança do processo” e em que “não é possível afirmar que o sistema eletrônico de votação está isento de eventual código malicioso”. O relatório é malicioso. Nada encontrou na verdade, mas não podia dizer isso. 


“🎼Oh, sim, eu estou tão cansado🎼”.

– As urnas eletrônicas são um orgulho nacional. A eleição acaba às cinco horas e três horas depois já se sabe quem foi eleito para deputado, senador, governador, presidente — disse Lula numa entrevista. Tudo normal.

Não podemos a achar normal não dar merenda para crianças, não ter remédio na farmácia popular, universidades não pagarem conta de luz.


“🎼Tudo em volta está deserto, tudo certo. Tudo certo como dois e dois são cinco🎼”.

O dia de ontem foi de chorar, rir e ter raiva. Em Brasília, o triunfo da normalidade. A política substitui os gritos e as ameaças pelas conversas para o convencimento. Lula disse que vai tentar convencer que as suas propostas são as melhores, e vai negociar com quem foi eleito, não apenas com quem gosta. Foi também o dia de chorar por  uma mulher que marcou o tempo e a vida. Tímida e espalhafatosa, irritação 🎼na cara dos caretas🎼.

Gil aos prantos fez a definição perfeita do momento em que todos eles surgiram para o Brasil com a explosão de talentos. “Ela apareceu ali, quando eu apareci, Caetano apareceu, nós todos nos aparecemos para todos nós. Ali em Salvador. E nos encontramos todos naquele encantamento pela música nova do Brasil”.


Parece que estamos voltando de um grande mergulho em um tempo em que era possível a presidência não dar qualquer palavra de consolo quando o Brasil perdeu o insuperável João Gilberto, Elza Soares e outros....


 “🎼Respeito muito minhas lágrimas, mas ainda mais minha risada, inscrevo, assim, minhas palavras na voz de uma mulher sagrada🎼”.

Caetano ontem, aos prantos declamou por ela. “Minha voz, minha vida. Meu segredo e minha revelação. Voz que é menos minha que da canção”.

Dia estranho, o de ontem. O alívio da normalidade, a tristeza da perda imensa. E os militares com resmungos, mas quem liga para eles? Não é mesmo, honey baby? Como disse  Boldrin, outro que nos deixou ontem: Estamos tirando do Brasil da gaveta!

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