sábado, 5 de fevereiro de 2022

Espancamentos na Barra

 


Três mortos por espancamento na Barra em um mês vai além da xenofobia. Aquele espaço público (praia)se tornou território de alguém. Da máfia que chamam de milícia, talvez? Os guardas municipais foram avisados e deixaram rolar. A polícia não estava. Por quê?

Um fato? A execução ter sido realizada a partir de uma reivindicação trabalhista. 

Isso supõe uma aliança entre a cultura dos linchamentos e a cultura da precarização do trabalho. Os garçons dos quiosques, chamados pelos donos de freelancers, não somente entregavam cardápios, mas cuidavam da segurança. Para evitar roubos. Sem formação nenhuma para isso. 

Ou seja, os assassinos de Moïse Kabagambe tinham carta-branca para vigiar um território público. E cada hora um garçom: a própria turba precarizada como vigia. Guarda Municipal? PM? Deixaram rolar. E se deixaram rolar (foram três mortes por espancamento em um mês) é porque era conveniente para o Estado.

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Não à toa, um dos assassinos disse a um casal de namorados ( representa os resquícios de civilização na Barra?)que Moïse tinha furtado algo e estavam dando um "corretivo". Um corretivo com taco de beisebol — as máfias que chamam de milícia usam tacos de beisebol — e fúria linchadora em nome da propriedade privada nesta república mafiosa. Qualquer cidadão que  reivindicar direitos (trabalhistas ou não, diga-se de passagem) em um território controlado por máfias? Basta alegar que ele estava roubando — lincha-se, depois se pergunta e se investiga e se absolve. 

Uma aliança entre a lógica das máfias e a lógica da implosão trabalhista. Retiram-se os direitos trabalhistas das massas na mesma medida em que se oferece a elas o direito de vigiar e matar. Quer trabalhar no quiosque? Aprenda a dar uma chave de perna e a manusear um taco de beisebol.

Os donos desse quiosque são Paulo Guedes e Michel Temer e cada golpista (jornalistas, inclusive) que tenha imaginado o tal Estado Mínimo sem uma consequência elementar: essa guerra de todos contra todos, como se a segurança fosse um vácuo e as máfias não estivessem assanhadas para multiplicar seus espaços.

Moïse era um trabalhador, ele deveria ser visto como um mártir do mundo do trabalho. Como Santo Dias, como Margarida Maria Alves, como os grevistas de Chicago. Só que nesta versão do século 21, pulverizada, sem que o trabalhador seja visto como trabalhador e homenageado como trabalhador.

Não foi só por 200 reais, mas foi também por 200 reais!


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