terça-feira, 19 de janeiro de 2021

VENEZUELA !


A Crise em Manaus é o cenário que se passa no Brasil: falta oxigênio. Falta mesmo. Em vários sentidos. Falta em um sentido real e concreto, pois o aumento das internações provocadas pelo  coronavírus levou ao colapso do sistema de Saúde desta que já é anunciada como a “capital mundial da covida-19”. Em Manaus, há falta de oxigênio nos hospitais para atender aos pacientes que ou estão sendo submetidos a ventilação manual, ou simplesmente acabam morrendo asfixiados dentro das instalações.
Podemos falar que falta oxigênio também no sentido metafórico. Metafórico porque este é o sentimento de uma parcela da população que é afetada e tem empatia pela situação  vivenciada em no país no  geral dessa pandemia. Há uma angústia, uma ansiedade temperada com desolamento e indignação quando somos obrigados a testemunhar um genocídio em marcha, os  casos da doença e a inexplicável ausência de políticas públicas que possam dar conta de um real enfrentamento dessa crise sanitária. 
Podemos falar da uma falta de oxigênio em um sentido ideológico. A eleição de Jair Bolsonaro em 2018 trouxe um governo descomprometido com a vida humana – para nos restringirmos a esse tema. Atravessamos uma pandemia  à deriva, com uma necropolítica instituída que mata ou deixa morrer principalmente a população preta, indígena e periférica, tendo alcançado um criminoso número de mais de 200 mil pessoas mortas e seguimos contando. Em meio às ameaças de impeachment do presidente, de um lado, e a manutenção de consideráveis índices de popularidade do mesmo no outro, faltam perspectivas de mudanças reais.
A ironia que se apresenta na Crise de Manaus é que justamente o país vizinho que continua sendo alvo das maiores polêmicas desde o período eleitoral, considerado uma ameaça para o Brasil, foi o que diante da catástrofe vivida , autorizou de forma imediata o envio de suprimentos hospitalares, colocando à disposição o oxigênio necessário para atender à contingência sanitária.  Para alguns a iniciativa do governo da Venezuela era “populista”, “irresponsável” e “midiática”, considerando sua realidade interna. Acredito que aponta para outras concepções de sociedade, de governo, de Estado, de relações internacionais que, ao contrário do que se supõe, podem ser muito ricas para oxigenar nossas ideias e nos ajudar a construir nossos próprios caminhos para sair do fundo do poço que nos encontramos.
Estamos diante de um “vírus civilizatório” que coloca em xeque o mundo tal qual conheciamos e cujos efeitos, com o afloramento das contradições sociais e a necessária reinvenção das estratégias de re-existência popular, podem surpreender  no sentido de trazer para a agenda política pautas ainda mais radicalizadas. E a Venezuela, desde 1998, com a eleição de Hugo Chávez, mantém acesa a chama  da possibilidade de se pensar outros mundos possíveis. Ainda que imersa em suas próprias contradições, é um país que transformou de forma significativa algumas bases estruturantes, deixando de ser uma realidade com baixíssima representatividade política no âmbito do Estado, para se tornar uma democracia intitulada de “participativa e protagônica” que coloca em movimento milhões de cidadãos de forma auto-organizada nos Consejos Comunales/CCs e Comunas.
Registro oficiais, são  mais de 48 mil CCs e três mil Comunas com cerca de quatro milhões de pessoas e não tenho dúvidas que o engajamento político e ação social desses sujeitos têm sido definidores nas respostas dadas por este país aos desafios que têm se apresentado nos últimos anos, tais como a morte do  Chávez em 2013, a guerra econômica empresarial e o embargo imposto pelos EUA, a hiperinflação, a crise de abastecimento, a pandemia propriamente dita, entre outros.
Com todas essas dificuldades, o país e, mais especificamente o Governo Maduro com sua base social, seguem firmes registindo as consecutivas tentativas de golpe e respondendo a mais essa crise com uma das mensagens mais singelas e, ao mesmo tempo, mais fundamentais para um outro futuro: a de que vidas humanas estão acima do lucro e que são razão para derrubar fronteiras, para restaurar ou redefinir relações de solidariedade e cooperação entre os países. Trata-se de um ingrediente indispensável na difícil, porém urgente caminhada na direção de um mundo pós-pandêmico que necessariamente seja melhor do que aquele que um dia conhecemos.
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