sexta-feira, 22 de abril de 2022

Uma pequena coisa que faz uma grande diferença.

 


Há algum tempo o governo Bolsonaro tenta desestruturar as instituições. O que demonstra ser uma estratégia de enfraquecimento das conquistas democráticas acumuladas ao longo de séculos. É  difícil lidar com quem não tem nenhum limite no trato com os direitos e garantias constitucionais e individuais.

Desde as eleições, quando o grupo que assumiu o governo federal resolveu usar mentiras, ataques pessoais e baixarias, nós deveríamos ter entendido que eles não mediriam esforços para alcançar o que pretendiam. E nem para se manterem no poder. A frase do coronel Jarbas Passarinho, ao assinar o AI-5, “Às favas todos os escrúpulos de consciência”, parece ter virado um lema para o atual governo.

Mesmo para quem está se acostumando com as criaturas bizarras que saem diretamente do esgoto que se transformou o governo do Brasil, está sendo difícil conviver com o modo com que estão tratando a questão da tortura durante o golpe assassino que se instalou no país após 1964.

Um grau de cinismo e desprezo pela dignidade da pessoa que, penso, só aparecem de maneira assumida por acreditarem esses bárbaros que o trabalho de desestruturar as instituições já lhes permite fazer, todo tipo de sandices. Quando o presidente da República exalta o sofrimento e homenageia o torturador, ele dá um sinal para os monstros saírem das trevas e assumirem suas faces verdadeiras.

A revelação dos áudios das sessões do Superior Tribunal Militar (STM) é de uma gravidade... Quem conhece o Projeto Brasil Nunca Mais, coordenado pelo Dom Paulo Evaristo Arns que, em 1985, em um ato de grande coragem e desprendimento, apresentou provas  baseadas em autos da Justiça Militar, de inúmeros casos de tortura.

Esse grupo pesquisou, clandestinamente, no período de 1979 a 1985, centenas de processos judiciais e, correndo o risco da própria vida, produziu importante documentação sobre os anos da ditadura. Os processos eram retirados dos cartórios por advogados, verdadeiros heróis, que cuidavam de tirar cópias escondidas para fotografar a história das barbáries. A história da ditadura. A história do Brasil.

Foram analisadas mais de 850 mil páginas de processos e o trabalho resultou no livro de não ficção mais vendido do país. Não havia como o Estado negar, pois eram documentos produzidos pelo próprio Estado: foram mais de 20 mil brasileiros torturados naquele período.

Quando penso que nada poderia ser mais cruel do que o presidente da República defender a tortura,  o horror é jogado friamente nas minha/nossas caras. Agora, com vozes cavernosas e macabras, através dos registros também obtidos oficialmente dos julgamentos do mesmo Superior Tribunal Militar.

Deu vergonha e nojo de ver o presidente do Tribunal, um general do Exército, ironizar as dramáticas gravações e dizer que elas “não estragaram a Páscoa de ninguém.” E ainda afirmar que eram “notícias tendenciosas” para atingir as Forças Armadas. O que atinge as Forças Armadas é o silêncio sobre as torturas. É a cumplicidade.

Sobre os mesmos fatos, o general vice-presidente da República tripudiou com o sentimento das famílias e de quem tem dignidade e humanidade ao afirmar, gozando: “Apurar o quê? Os caras já morreram tudo, pô (risos). Vai trazer os caras do túmulo de volta?”

No mesmo dia, um ex-integrante do Exército, que serviu na Brigada Paraquedista, resolveu contar detalhes dos flagelos a um jovem casal, morto em 8 de dezembro de 1968, após a “menina ter tomado choque na vagina, no ânus, na boca, nos lábios”. Covardes. Bandidos. Eles  envergonham a humanidade.

A banalização da violência, o culto à tortura, o desprezo à vida e ao Estado democrático são um alerta para todos. As próximas eleições podem ser as mais importantes da História do Brasil, até porque podem ser as últimas. Nenhum povo aguenta viver sob a barbárie.

Vamos fazer de nossas dores e dos nossos horrores uma força para tirarmos a venda da tirania e as amarras do nosso imobilismo e enfrentar os vermes que vivem do submundo. Como me ensinaram: “Atitude é uma pequena coisa que faz uma grande diferença.”.

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