segunda-feira, 3 de outubro de 2022

BOLINHO DE CHUVA

 


Não fiz bolo, porque nem estou podendo comer tanto assim, mas lembro bem dos dias em que, ao lado da pia da cozinha, esperava, ansioso, pela tigela onde a senhora havia misturado os ingredientes, certo de que iria me deliciar com os sabores crus do que deixaria de ser em minutos. Sim, adorava a massa de bolo crua feita por Ela. Ainda tento reproduzir por aqui, não faço muito sucesso.

Então, lá se vão mais de 20 anos que Ela resolveu dar um tempo disso aqui, mas no aniversário revisita sempre o meu coração e os meus pensamentos.

Ela foi um porto mais do que seguro e, ao longo desses meus 62, quase 63 anos, consegui atracar nele sempre que precisei; às vezes, a maré não colaborava muito, mas, ao final, havia sempre o poder da sabedoria em escolher os momentos, o tempo e os lugares certos para fazer isso. Digo, sabedoria dela e não minha.

Queria o pedaço do bolo, deliciosamente saboreado na louça pintada por Ela, mas, enfim, me alimento dele nas muitas e saudosas lembranças dos dias em que o cheiro do forno era o suficiente para ficar por ali, rodeando a pia à espera do que já estava devidamente cozido.

A morte? O que é a morte? Ela segue vivísssima nos meus pensamentos. Deixamos de existir quando não habitamos mais as lembranças daqueles que amamos. Parabéns pelo 96 anos que a senhora faria.


Obs.: Nunca mais comi bolinho de chuva!

Nenhum comentário:

Postar um comentário