sexta-feira, 22 de julho de 2022

CARNAVAL EM OUTUBRO

 




É difícil definir o que nos foi levado primeiro. A esperança? A alegria? Não!  O futuro. Mas uma lucidez e uma expectativa me invade. Há um estranho e indefinido sentimento de perplexidade no ar. Deixamos de ser o país que, mesmo com profundas contradições e desigualdade, tinha o sonho da mudança para se tornar mais justo e igualitário. O Brasil secou. E viramos uma pátria triste, sem ar, sem charme. O futuro não chegou a ser sonhado, foi destruído pela mesmice e pela obviedade de um bando de bárbaros. 

O grande trunfo é ter (sobre)vivido e poder ter histórias para contar. O passado é nosso companheiro nos  momentos de solidão. Quem foi feliz começa a se achar poderoso e a imaginar uma hipótese de viver com o crédito de vidas passadas. O futuro deixou de ter um objetivo, a juventude é um susto contido, e a vida, enfim, é uma incógnita diária. Nós temos que nos reinventar para enfrentar e conviver com a extrema direita vulgar e criminosa que está no poder. É indescritível o número de absurdos. Se fosse ficção seria inimaginável criatividade surrealista. Mas é a vida real. O dia a dia é de uma mediocridade irritante. A Fundação Palmares excluiu da nossa história  de personalidades negras, como Gilberto Gil, Martinho da Vila, Milton Nascimento e tantos outros; removeu do site biografia escritores(as), como da Carolina de Jesus. Sem contar o escandaloso fato que foi a retirada da estátua de Zumbi dos Palmares da entrada da sede da Fundação. E o  que me envergonha,  excluirá qualquer referência a Carlos Marighella pois seus textos “são como escritos de Hitler.”

Uma secretária do Ministério da Saúde disse à CPI, que existe um “pênis na porta da Fiocruz”. Num país onde o presidente da República frequentemente se ampara em piadas chulas, provavelmente trata-se da manifestação de um desarranjo sexual exteriorizado por uma pseudo segurança. Parece que a sua família está no limite do armário e do divã. E o pênis é o fetiche dos seguidores bolsonarentos.

No meio de todas lutas, que nos mobilizam e nos definem, temos um espaço real. E ainda assim alguns tem dúvidas. Nós que não suportamos mais esse governo que cultua a morte, que se coloca de costas pra vida, que despreza a dor das pessoas e que teve a desfaçatez de ridicularizar os que sofrem pela falta de oxigênio, os que querem deixar de ser prisioneiros do obscurantismo e do atraso demonstraremos nossa indignação em outubor. Uma manifestação pacífica na qual as pessoas ocuparão as ruas em sinal de inconformismo com a política genocida do governo B*ls*naro. Organizado pelos Comitês, o protesto pela tristeza e revolta generalizadas pelo caos das nossas vidas diárias. Estarão conosco, lado a lado, num abraço invisível e de mãos dadas, as memórias de mais de 650 mil brasileiros que foram levados pelo vírus. Boa parte deles em razão da irresponsabilidade criminosa do presidente da República e seus cumplices!

Andará também, junto a cada um de nós a memória dos familiares, dos amigos, dos conhecidos e até dos desconhecidos. Um silêncio de dor e saudade será mais forte do que qualquer grito de inconformismo. Nada fala mais alto aos nossos corações do que a falta de um pessoa querida. Não tenhamos, a pretensão de sermos percebidos por "eles". "Eles" vivem em um mundo imaginário originado pela mentira e suportado pela hipocrisia. A insensibilidade "deles" criou um muro e, do lado de fora, ficaram a solidariedade, o humanismo e a empatia. Nós, enfim.


Vamos mostrar para nós mesmos que é possível resistir. Que nós não perdemos a capacidade de nos indignar. E de sonhar por um mundo, de novo, justo e igual. Foi difícil a decisão de ficar  em casa de não sair, pois a aglomeração é a arma dos fascistas. Foi um ato de legítima autodefesa e de terceiros. No silêncio das nossas casas presenciamos um genocídio, um massacre, um extermínio. Vamos mostrar em 03 de outubro ao mundo que nossa dor é coletiva, que a indignação é de todos.

E vou de verde e amarelo. Os fascistas, que roubaram a dignidade, a esperança, o presente e o futuro, se apropriaram inclusive das nossas cores, que passaram a representar certa vergonha nacional. Será também uma maneira de dizer não a esses incultos. Voltar a usar o verde e amarelo é também uma maneira de dizer não a essa barbárie, de resistir. Sem medo de ser feliz.


Eu brasileiro confesso

Minha culpa meu pecado

Meu sonho desesperado

Meu bem guardado segredo

Minha aflição

Eu, brasileiro, confesso.


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